Tudo que é preciso evitar antes de tomar ayahuasca
Esta matéria foi originalmente publicada na TONIC US.
A verdade por trás de todas aquelas restrições antes de consagrar um cházinho.

Antes de participar de meu primeiro retiro de ayahuasca no México, no ano passado, o organizador do evento enviou uma lista de alimentos e afins que todos deveriam evitar: nada de drogas por três semanas, nada de bebida ou porco por duas semanas nem latícinios, frituras, cafeína ou açúcar por dois dias. Os argumentos por trás de algumas das orientações pareciam meio dúbios, no mínimo (“nada de sal porque plantas como a ayahuasca gostam de água doce e não salgada”), já outros eram mais convincentes (“nada de alimentos com um aminoácido chamado tiramina porque ele pode aumentar sua frequência cardíaca, bem como a ayahuasca”). Algumas orientações aparentemente pretendiam servir como guia para se ter uma experiência melhor, já outras se voltavam para prevenção de quaisquer problemas de saúde. Devo comentar que, mesmo seguindo tudo à risca, duas de minhas três experiências foram bem fraquinhas.
Após ter meu inscrito para meu segundo retiro, desta vez na Holanda, vieram algumas instruções simples: evitar alimentos ricos em tiramina no dia anterior e parar de tomar quaisquer remédios com dois dias de antecedência. Comi nuggets de frango e batata frita na noite anterior à cerimônia, também tomei dois cafés com leite naquela manhã e tudo correu bem: a experiência foi intensa e eufórica. Os cogumelos que havia comido uma semana antes (afinal, eu estava na Holanda) não parecem ter atrapalhado em nada o meu lance com a ayahuasca, então me peguei questionando se tantas restrições eram mesmo necessárias – ou mesmo se qualquer restrição destas realmente vale de algo.
As alterações na alimentação prescritas por xamãs e organizadores de retiros como estes muitas vezes são chamadas de “dieta da ayahuasca”, mas tal dieta parece mudar de cultura para cultura, de acordo com Alex Gearin, antropólogo especialista em medicina e pesquisador honorário da Universidade de Queensland, na Austrália. “Há muitas crenças e recomendações na hora de se tomar ayahuasca em meio à Amazônia, por exemplo”, afirma. “A restrição alimentar mais comum nesses casos é com relação à carne de porco; a dieta purifica a mente e o corpo para recepção de trabalhos xamânicos como cura, caça, magia ou divinação.”
Há poucas pesquisas científicas que sustentem tais práticas, de acordo com Luís Fernando Tófoli, professor de psicologia médica e psiquiatria da UNICAMP. De fato, algumas das culturas que consomem ayahuasca contam com costumes que contradizem estas recomendações; a tradição brasileira do Santo Daime, por exemplo, envolve, em algumas ocasiões, o consumo de maconha durante as cerimônias. Já a União do Vegetal não apresenta nenhuma restrição alimentar e seus membros não apresentaram nenhum problema em especial, afirma Tófoli.
“Há alguns relatos de indivíduos que afirmaram ter tido uma experiência mais ‘clara’ com a ayahuasca ao seguir uma dieta compatível com a tradição vegetalista”, complementou Tófoli. “Infelizmente não dispomos de estudos que tenham examinado tais questões.”
Ainda assim, há dados em relação à tiramina, encontrada em queijos maturados, carnes curadas e alimentos em conserva, que sugerem que seu consumo em conjunto com inibidores de monoamina oxidase (IMAOs), como aqueles presentes na ayahuasca, pode ser perigoso. “Tanto a ayahuasca quanto a tiramina podem aumentar a pressão sanguínea”, afirma Scott Keatley, nutricionista nova-iorquino. “Caso a pressão sanguínea aumente muito de forma súbita, a crise hipertensiva pode levar a infartos, problemas cardíacos generalizados, perda de função renal, dores de cabeça e ansiedade.”
Alimentos que contenham triptofano, como é o caso de carnes como peru e laticínios, também podem causar problemas. Ao menos é o que afirma James Giordano, professor de neurologia e bioquímica do Centro Médico da Universidade de Georgetown, nos EUA; o triptofano aumenta a disponibilidade do neurotransmissor serotonina no cérebro e como a ayahuasca já estimula a liberação deste, o resultado pode ser um excesso de serotonina que pode levar a tremedeira, batimentos cardíacos acelerados, ansiedade, febre e até mesmo danos cerebrais em casos mais severos.
Evitar o consumo de álcool e demais drogas é recomendável também, de acordo com Tófoli, levando em conta alguns relatos de pessoas que tiveram experiências complicadas com ayahuasca após uso de álcool e cocaína. Qualquer estimulante, caso da cocaína, pode aumentar suas chances de sofrer uma arritmia cardíaca sob efeito da ayahuasca, disse Giordano. O MDMA é considerado uma droga especialmente problemática pois aumenta os níveis de serotonina, e consequentemente riscos advindos do excesso desta; Giordano recomenda que se evite o uso de drogas recreativas ao menos um dia antes e um dia depois de se tomar a ayahuasca. O mesmo pode ser dito para o álcool, que pode acabar aumentando os efeitos do DMT presente na ayahuasca, fazendo com que as sensações, as náuseas e o aumento de